A Corrida de Obstáculos




    Era o verão mais quente e mais alegre vivido por ambos. A Filipa e o Miguel eram um casal jovem que morava no centro de uma pequena aldeia. Estavam prestes a concretizar um do seus maiores sonhos: serem pais! Estavam ansiosos, pois, no mês seguinte, em Agosto, era chegado o momento por que tanto ansiavam.

 



O casal prepara tudo para a chegada do novo membro da família. O tempo ia passando. Estava cada vez mais perto o dia de receberem o seu menino!

O bebé, de nome Francisco, nasceu num dia chuvoso. Levou tempo, mas tudo valera a pena.  

Francisco apresentou-se ao mundo como um menino pequeno, mas forte. Assim pensaram todos até ao momento em que o médico se dirigiu aos pais dizendo:

- Como se sente, senhora Filipa? Temos aqui um menino muito forte, mas temos que conversar.

 



 Nesse momento, os pais deste lindo bebé viram a sua vida a voltar para trás. Neste preciso instante, os pais de Francisco tomaram conhecimento de que o seu bebé tinha nascido com um problema que o iria acompanhar para o resto da sua vida.

Miguel e Filipa estavam muito nervosos e confusos. Como é que um menino tão forte havia nascido com tal problema?  Logo questionaram:

- Desculpe, doutor. Nós não estamos a entender. Mas, afinal, o que é que o nosso bebé tem?

O médico explicou mais uma vez que Francisco quando nasceu teve falta de oxigénio e que isto iria afetar a sua vida, teria consequências no futuro. Só não poderia precisar naquele momento a extensão do problema. Com o passar do tempo, quando ele crescesse, poderia identificar as consequências. 



Naquele momento, os pais sentiam-se perdidos, não sabiam o que fazer! Mas sempre que olhavam para o seu bebé viam um menino lindo e forte. Pequeno no tamanho, é verdade, como todos os bebés…

Francisco, na companhia da sua família, regressou, finalmente, a casa.



O tempo foi passando e este bebé pequeno tornou-se num bebé grande. Cada dia que passava era mais um dia de descobertas para os seus pais. A vida de Francisco era como um puzzle, uma peça encaixada na outra ... um puzzle inacabado!

Francisco tinha apenas uns mesitos quando os pais começaram a notar algumas diferenças no filho, comparativamente a outras crianças. O diagnóstico estava completo:  Francisco tinha Paralisia Cerebral.

 



 Filipa e Miguel ficaram apavorados quando ouviram estas palavras. Na verdade,  não sabiam o que isto significava… Foi então que procuraram respostas para as suas questões, pesquisaram para poderem compreender o seu filho. Por mais respostas que obtivessem, a dúvida estava sempre presente, acompanhava-os para todo o lado.

Os dias e as noites iam passando, o tempo não parava… As dúvidas, as incertezas eram como nuvens, que não permitiam ver o futuro com nitidez, sem sombras e sem medo. 



 Este jovem casal que tanto queria formar uma família e vivenciar cada momento em plena harmonia, passou a viver numa corrida de obstáculos em que o tempo era determinante.

Francisco e os seus pais revelaram-se uns verdadeiros lutadores. Aos poucos iam compreendendo melhor o seu filho, as suas reações, as suas ações, os seus pedidos, as suas exigências, os seus desejos, as suas vontades … a sua vida.

 Nesta corrida, o tempo é um adversário veloz. Quando olharam para a pista, Francisco já era um menino crescido; contudo, continuava a ser um bebé que dependia dos pais para tudo. Era um menino diferente dos meninos e meninas da sua idade.



A cada dia, a cada semana, a cada mês, a cada ano Francisco ia-se tornando maior, mas não era só ele que crescia… eram também as dificuldades, as incertezas, as dúvidas, mas acima de tudo o amor que estes pais e família tinham por aquele menino.

Francisco já tinha idade para poder caminhar, correr livremente, para falar, mas não conseguia. Dizia tudo o que queria através do olhar brilhante que sempre o acompanhou!



Os anos continuaram a passar e a família deste pequeno lutador continuava a ter esperanças que um dia ele conseguisse caminhar para não depender tanto dos pais. 

Quando Francisco fez quatro anos, um novo obstáculo teria de ultrapassar: estava na altura de começar a frequentar o pré-escolar. Filipa e Miguel veem-se, novamente, perante mais uma dificuldade. Onde matricular o seu filho? Tinham duas opções, numa escola “normal” ou numa escola com crianças iguais a ele. O que seria correto? O que seria melhor para este pequeno menino?



Depois de muito pensar, decidiram matricular o Francisco numa escola onde ele pudesse crescer, viver, conviver com crianças diferentes dele. Porque na opinião destes pais seria o melhor para Francisco.  

Em Setembro, Francisco iniciou uma nova etapa com todo o apoio da família. Estes primeiros anos da sua vida escolar, até correram bem porque era um menino pequeno. Mas, afinal, quem não era naquela sala de crianças adoráveis? Estavam todos no pré-escolar, era apenas uma escola com meninos pequenos que por vezes queriam um colinho, como este menino que andava de colo em colo. Eram crianças com apenas três, quatro, cinco anos, que viam esta nova criança como um bebé, mas que não entendiam a verdadeira realidade. 



Com o avançar rápido do tempo, o bebé transformou-se num menino de seis anos. Logo, novas dúvidas surgiram:

-          E agora? O que fazemos com o nosso menino? – interrogava-se a mãe.

-          Todas as crianças vão para a escola. E o nosso menino? – perguntava o pai.

Estas foram as perguntas que os pais fizeram um ao outro dezenas de vezes. O que fazer com o seu filho, teria de mudar de escola, para onde iria? Após longas reflexões, novamente, decidiram que o percurso devia ser como qualquer criança. Assim, continuaria na escola junto com as outras crianças. Afinal, este é o desígnio da escola inclusiva – uma escola para todas as crianças, independentemente das suas características.

Aos seis anos de idade, Francisco como qualquer criança começa a frequentar o primeiro ano de escolaridade, mas logo começam a surgir problemas de outra ordem. 



No primeiro dia de aulas, Filipa foi levar o seu filho à nova escola. Francisco como qualquer menino ia alegre, sorridente com tudo a que tinha direito, assim pensava a mãe. Mal chegou ao estabelecimento de ensino, logo apareceu o primeiro obstáculo. Como entrar na escola? A escola era um edifício novo, mas ninguém se lembrou que há crianças que não têm a possibilidade de andar, que têm de recorrer a uma cadeira de rodas para se movimentar e que não sobem escadas.

A mãe de Francisco, desolada, dirigiu-se à directora da escola e exprimiu a sua tristeza:

- Como é possível que haja uma escola construída de raiz sem que tenha acessos para o meu filho e outras crianças em cadeira de rodas? Vocês já sabiam que iriam receber uma criança que depende da cadeira de rodas para se movimentar.

- Desculpe, minha senhora – respondeu a directora muito embraçada – vamos já tratar desse assunto. Peço- lhe desculpa mais uma vez.



Filipa em silêncio retirou-se da sala com o seu filho ao colo e dirigiu-se para a sala de aulas onde Francisco teria a sua primeira aula. Enquanto isso, a directora ficou de resolver o problema de acesso à escola, mas ainda demorou uns dias até que Francisco pudesse entrar na escola na sua cadeira de rodas.

Infelizmente, este foi apenas o primeiro obstáculo. Já estava Francisco na sala de aulas, quando repararam que a mesma não tinha uma mesa que se adaptasse à sua cadeira. Entretanto, rapidamente, a professora arranjou uma solução e adaptou a sua secretária a este novo aluno.

Mas terão os problemas terminado? Não … este tinha sido apenas o primeiro dia. 



Nas aulas, Francisco não conseguia acompanhar os seus colega, pois as suas capacidades motoras não lhe permitiam utilizar os materiais como os outros. Conclusão: a escola não tinha material adequado. A professora de Francisco, a professora Sónia, não sabia o que fazer. Entretanto procurou soluções e lá foi construindo materiais adequados ao Francisco. Com os recursos adequados, este menino conseguia aprender. Não tão depressa como os seus colegas, mas conseguia aprender, graças ao esforço e ao trabalho da sua professora.

As semanas, os meses iam passando, e os colegas começaram a não aceitar bem o Francisco. Não brincavam com ele. No intervalo, este menino ficava sempre junto dos adultos. As crianças não se dirigiam a ele, não conversavam, não o levavam para o recreio. Aos poucos a alegria de Francisco foi desaparecendo… até que a professora se apercebeu e logo expressou o seu sentir:

- Isto assim não pode ser! Como é possível as crianças desprezarem uma outra criança que necessita de mais ajuda e de mais apoio? Já amanhã este assunto será resolvido!

 Nas aulas, Francisco não conseguia acompanhar os seus colega, pois as suas capacidades motoras não lhe permitiam utilizar os materiais como os outros. Conclusão: a escola não tinha material adequado. A professora de Francisco, a professora Sónia, não sabia o que fazer. Entretanto procurou soluções e lá foi construindo materiais adequados ao Francisco. Com os recursos adequados, este menino conseguia aprender. Não tão depressa como os seus colegas, mas conseguia aprender, graças ao esforço e ao trabalho da sua professora.

As semanas, os meses iam passando, e os colegas começaram a não aceitar bem o Francisco. Não brincavam com ele. No intervalo, este menino ficava sempre junto dos adultos. As crianças não se dirigiam a ele, não conversavam, não o levavam para o recreio. Aos poucos a alegria de Francisco foi desaparecendo… até que a professora se apercebeu e logo expressou o seu sentir:

- Isto assim não pode ser! Como é possível as crianças desprezarem uma outra criança que necessita de mais ajuda e de mais apoio? Já amanhã este assunto será resolvido!



E assim foi. Na manhã do dia seguinte a professora decidiu agir:

- Meninos e meninas, nós hoje vamos ter uma aula diferente! Nesta sala somos todos cidadãos e cidadãs com direitos e deveres. Sobre este assunto, vamos ver um vídeo muito interessante. Todos somos diferentes! Uns são mais altos, outros mais pequenos, uns mais gordos, outros mais magros, uns louros, uns morenos, uns conseguem andar pelos seus pés, outros necessitam de uma cadeira para se deslocar como o Francisco. Quando ele nasceu, teve uns problemas que o impediram de andar e de fazer algumas coisas como vocês. Algum de vocês já andou numa cadeira de rodas?

- Eu não! – respondeu a Maria, uma colega do Francisco, enquanto os outros envergonhados meneavam a cabeça em sinal negativo.



Determinada, a professora Sónia pegou no Francisco e sentou-se com ele ao colo no tapete que havia junto ao quadro. Pediu aluno a aluno que se sentasse na cadeira de rodas e experimentasse andar com ela na sala. O Francisco parecia divertido com a brincadeira e muito se riu com a falta de habilidade dos colegas.

- Então, meninos, como foi andar na cadeira de rodas do Francisco? – perguntou a professora.

José, um colega de Francisco, logo respondeu:

- Não é fácil professora! O espaço entre as mesas é pequeno.

- É muito cansativo, professora! – contestou a Maria.

A professora Sónia continuou a questionar a turma:

- Como acham que é a vida do Francisco? Como se sentirá o Francisco quando vos vê a brincar e não pode sair da cadeira? O que podemos fazer para tornar a vida do Francisco mais agradável e feliz?

 Muitas foram as respostas dadas às questões. As crianças começaram a perceber que estavam a agir mal com o Francisco.

 - Daqui a pouco está na hora do intervalo. Vocês o que vão fazer?

 - Brincar, professora – respondeu o José.

 - Pensei que iam ficar aqui dentro fechados! – exclamou a professora.

  A resposta do José veio pronta:

 - Não, professora, nós gostamos de brincar na rua! Não gostamos de ficar aqui fechados no intervalo. 

- Estou a ver que brincar no recreio é importante para vocês. E para o Francisco, o que acham?

 - Ele deve gostar também.

 - Então, por que nunca brincam com ele no recreio? Ele é um menino como vocês … ele gosta de vir para a escola, de brincar, de conversar, mas precisa da vossa ajuda!

 



As crianças atentas viram o vídeo que a professora lhes trouxera. Falava de uma menina, com paralesia cerebral, que frequentava uma escola fantástica, com professores e crianças formidáveis. Naquela escola, a alegria reinava e todas as crianças eram felizes. Também a menina com dificuldades vivia experiências de aprendizagem e de convívio maravilhosas. 



O vídeo estava a terminar quando a campainha da escola tocou. Estava na hora do intervalo e subitamente todos os meninos se levantaram. Uns foram ter com o Francisco para ajudar a professora a sentá-lo na cadeira, outros desviaram as mesas e as cadeiras, outro abriu a porta e pediu aos colegas do corredor para terem cuidado com o Francisco. Todos o ajudaram a sair da sala e levaram-no, pela primeira vez, para o recreio onde brincaram todos juntos.


Aos poucos, a atitude desta turma foi contagiando a escola até que todos os alunos e alunas compreenderam que Francisco era um menino, uma criança, com direitos e deveres como qualquer cidadão.